Distribuir palavras talvez possa ser fraqueza e deixa à mostra do inimigo alguma insensatez. Melhor não dizer. Melhor calar-se e mostrar-se sorrateiramente. Deixa assim, o dito pelo não-dito. E ficamos bem.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

A(os)deus(es)

Eu posso omitir sua despedida. Guardá-la para mais tarde, depois do chá, quem sabe. Mas o sol já despontou e não dá para aguardar novamente a lua cheia. Então tivemos que estar assim, aumentando um a cicatriz do outro. Autoflagelação, ou autorremediação. Não sei. Nunca soube. Nunca tive os pés no chão, mas também não cheguei a voar. Talvez tenha até ameaçado vôo, mas não deu, você não me deu, seu ouro, sua voz, seu perfume e seu olhar. Incompleto também estava e assim permaneceu, numa constante (in)stabilidade. Não sei de onde, nem quando as pessoas começaram a querer essa coisa chamada amor. Amor que deve ser perfeito, harmônico, sobrenatural. Além de si, além do outro, além de tudo. Além mesmo do que você pode oferecer. E fica assim, esse eterno vício, em débito. Depois, é claro, de creditar tantas mil e frustradas esperanças. Eu sempre esperei a sua volta, a sua ida até mim. O seu mais perfeito e completo amor. Mas você chegou atrasado, três vezes atrasado. Agora já estou arrumada, pronta para embarcar. Seu perfume ainda está impregnado em mim, até que um dia outro beija-flor devolva meu cheiro. [Estarei lá, quem sabe, te esperando, com um olhar solitário e um vazio, companheiros meus de sempre]. Não deu. Não tinha que ser. E você se foi, com os olhos cheios e o coração também. E você vai tentar me esquecer, só que seu coração ainda estará ali, batendo tão ardentemente por mim, como você mesmo falou. Maysa Sales

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Extravios

"Eu te agradeço por esse afastamento lento e gradual e pela viagem interrompida por seus perpétuos atrasos causados pelo medo de tirar os pés do chão. Agora, a cada dia eu preciso de uma roupa nova desde que minhas malas foram extraviadas para sempre com todo o nosso excesso de bagagem.
Eu te agradeço pela honestidade da sua omissão tão previsível que sempre confundi com meus presságios. Essa ida sem despedida que você covardeou: eu finjo que não sei, você finge que não foi.E a gente segue inventando que ainda se interessa pelo que começamos a construir juntos, num outro contexto, pra realçar nossos vínculos.

Eu te agradeço a descoberta de que se não seguimos juntos nessas coisas do amor,
seja porque talvez
eu, veterana
enquanto
você ama-dor."